A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, por maioria
de votos, Habeas Corpus (HC 112563) e absolveu um pescador de Santa
Catarina que havia sido condenado por crime contra o meio ambiente
(contra a fauna) por pescar durante o período de defeso, utilizando-se
de rede de pesca fora das especificações do Ibama. Ele foi flagrado com
12 camarões. É a primeira vez que a Turma aplica o princípio da
insignificância (ou bagatela) em crime ambiental. O pescador, que é
assistido pela Defensoria Pública da União (DPU), havia sido condenado a
um ano e dois meses de detenção com base no artigo 34, parágrafo único,
inciso II, da Lei 9.605/98 (que dispõe sobre as sanções penais e
administrativas impostas em caso de condutas e atividades lesivas ao
meio ambiente).
O relator do HC, ministro Ricardo Lewandowski, que negou a concessão do
habeas corpus, ficou vencido após a divergência aberta pelo ministro
Cezar Peluso e seguida pelo ministro Gilmar Mendes. Para o ministro
Lewandowski, embora o valor do bem (12 camarões) seja insignificante, o
objetivo da Lei 9.605/98 é a proteção ao meio ambiente e a preservação
das espécies. O relator acrescentou que não foi a primeira vez que o
pescador agiu assim, embora não tenha sido enquadrado formalmente como
reincidente no processo. “Esse dispositivo visa preservar a desova dos
peixes e crustáceos, na época em que eles se reproduzem. Então se
permite apenas certo tipo de instrumento para pesca, e não aquele que
foi utilizado – uma rede de malha finíssima”, afirmou.
O ministro Peluso divergiu do relator, aplicando o princípio da
insignificância ao caso. Foi seguido pelo ministro Gilmar Mendes, que
fez rápidas considerações sobre o princípio da insignificância.
“Precisamos desenvolver uma doutrina a propósito do princípio da
insignificância, mas aqui parece evidente a desproporcionalidade. Esta
pode ter sido talvez uma situação de típico crime famélico. É uma
questão que desafia a Justiça Federal e também o Ministério Público. É
preciso encontrar outros meios de reprimir condutas como a dos autos, em
que não parece razoável que se imponha esse tipo de sanção penal”,
concluiu.
A lei estabelece que comete crime contra a fauna aquele que “pescar em
período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por
órgão competente” e também quem “pesca quantidades superiores às
permitidas ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e
métodos não permitidos”. O pescador foi flagrado com 12 camarões e uma
rede de pesca fora das especificações da Portaria 84/02 do Ibama. Foi
condenado a um ano e dois meses de detenção. A Defensoria Pública apelou
da sentença, pedindo ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4)
que aplicasse ao caso o princípio da insignificância (ou bagatela) por
considerar que a pesca de uma dúzia de camarões, mesmo com rede
inapropriada, era insuficiente para causar dano ao meio ambiente.
A 8ª Turma do TRF-4 reduziu a pena privativa de liberdade imposta e
determinou a substituição por uma pena restritiva de direitos. Afirmou,
entretanto, que as infrações penais ambientais não admitiam a aplicação
do princípio da insignificância. A Defensoria recorreu então ao Superior
Tribunal de Justiça (STJ), que reafirmou a tese de que não se pode
afastar a tipicidade de condutas em caso de crime ambiental. No HC ao
Supremo, a Defensoria Pública reafirmou a tese favorável à aplicação do
princípio da insignificância em crime ambiental. Alegou que foi mínima a
ofensividade da conduta do pescador e reduzido o grau de
reprovabilidade de seu comportamento.
“Considerando a atividade de pesca em período de defeso e a apreensão de
uma única rede fora (parcialmente) dos padrões do Ibama, a
reprovabilidade da conduta é tão pequena que punir o agente pescador de
12 camarões demonstra o exagero da atuação do Estado. Doze camarões não
são suficientes para atingir o bem juridicamente tutelado. Isso porque é
despropositada a afirmação de que a retirada de uma dúzia de camarões é
suficiente para desestabilizar o ecossistema da região”, afirmou o
defensor público no HC impetrado no STF.
Processos relacionados: HC 112563
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